Ela parou e olhou para mim. Foi como se tivesse tirado uma espécie de capa da frente do rosto, da frente dos olhos. Eram os olhos: entre o estúpido e o esperançoso e lugubremente desejosos de uma decepção, tudo ao mesmo tempo. Mas via-se que tinha algum problema. Qual é o seu problema? – disse eu. – Diga-me o que quer. Estou muito ocupado. – Não que eu quisesse apressá-la, mas um homem não tem a vida delas.
- É aquele problema das mulheres – disse ela.
- Ah – disse eu. – Só isso? – Pensei que talvez fosse mais nova do que parecia e a primeira vez que lhe apareceu a tivesse assustado, ou que fosse irregular como costuma acontecer com as raparigas muito novas. – Onde está a tua mãe? Disse eu. Não tem mãe?
- Está acolá na carroça – disse ela.
- Por que não fala com ela antes de tomar remédios? – disse eu. – Qualquer mulher lhe explicaria tudo. – Ela olhou para mim e eu olhei para ela e disse: - Quantos anos tem?
- Dezassete – disse ela.
- Ah – disse eu. Pensei que talvez fosse… – Ela observava-me. Mas, também, pelos olhos todas elas parecem que não têm idade, mas sabem tudo. – És regular de mais ou de menos?
Ela deixou de olhar para mim, mas não se mexeu. – Sim – disse ela. Acho que sim.
- Bem, qual das duas coisas? – disse eu. Não sabe? – É um crime e uma vergonha; mas ao fim e ao cabo depois vão comprá-lo a outro lado. E ela ali parada, sem olhar para mim. – Queres alguma coisa que faça isso parar? – disse eu. – É isso?
- Não – disse ela. – É que… já parou.
- Bem, o que… – A cara dela estava ligeiramente virada para baixo, imóvel, como elas sempre fazem quando falam com um homem para ele não saber o que virá a seguir. – Não é casada, pois não? – disse eu.
- Não.
- Ah – disse eu. E há quanto tempo parou? Cinco meses talvez?
- Só estou de dois – diz ela.
- Bem, aqui na loja não tenho nada do que quer comprar – disse eu – a não ser que queira uma tetina. E o meu conselho é que compre uma, volte para casa e conte ao seu pai, se o tiver, e deixe ele obrigue alguém a comprar-lhe uma licença de casamento. Era só isso que queria?
Mas ela continuava a ali parada a olhar para mim.
- Tenho dinheiro para lhe pagar – disse ela.
- É seu ou ele foi homem que chegasse para lho dar?
- Foi ele que mo deu. Dez dólares. Disse que chegava.
- Na minha farmácia nem mil dólares nem dez cêntimos chegariam – disse eu. Siga o meu conselho, volte para casa e conte ao seu pai ou aos seus irmãos se os tiver ou ao primeiro homem que encontrar na estrada.
Mas ela não se mexeu. O Lafe disse que eu podia comprá-lo na farmácia. Ele disse-me para eu lhe dizer que eu e ele nunca íamos dizer a ninguém que o senhor nos tinha vendido aquilo.
- E eu só queria que esse seu adorado Lafe tivesse vindo ele próprio comprá-lo; isso é que eu queria. Não sei, nessa altura teria um pouco de respeito por ele. E você pode voltar pelo mesmo caminho e contar-lhe o que eu disse… se a estas horas ele não estiver já a caminho do Texas, o que eu não duvido nada. Eu, um farmacêutico respeitável, com uma porta aberta, pai de família e bom cristão, há cinquenta e seis anos nesta cidade. O que me apetece é ir eu próprio contar aos seus pais, se conseguir descobrir quem são.